terça-feira, agosto 30, 2005
  O Triste Fado Estival

O meu país arde. E não é apenas em sentido metafórico. Dia após dia as televisões trazem-nos imagens de gente em desespero, quase sempre gente humilde, sem voz, sem influência política ou qualquer outra, que assiste impotente à brutalidade das chamas devastadoras que consomem milhares de hectares de florestas e quantas vezes lhes raiam as parede de suas casas, lhes devoram os parcos haveres, amealhados em tantos anos de sacrifícios e os deixam sem meios de subsistência, gente pobre que numa agricultura de quase subsistência garante a sua sobrevivência e que na sua modéstia e humildade não pode e não sabe reivindicar, exigir. São quase sempre idosos, os velhos que abandonámos no interior ao mesmo tempo que abandonámos o próprio interior. O país é assimétrico a vários níveis: ao nível do desenvolvimento económico, ao nível demográfico, ao nível dos afectos. Tardiamente, demasiado tarde, os responsáveis políticos condescenderam em deslocar-se às zonas sinistradas para observar, levar algum conforto, uma palavra de solidariedade. É pouco, mas ele há gestos que valem pelo seu simbolismo.
Ele há relatórios, diagnósticos, recomendações que de ano para ano se repetem assim como se repetem, ano após ano, este pavor que são os incêndios estivais. Inépcia, desleixo, irresponsabilidade, que mais poderemos concluir?
Condições naturais? Elas são, mutatis mutandis, as mesmas que encontramos no restante sul europeu. E contudo a incidência de fogos verificada no País é, comparativamente, assustadora, vergonhosa.
E as forças político-partidárias, senhores, que deviam ter algum decoro e conjugar esforços no combate a este flagelo, tenebroso pelas suas causas e pelas suas consequências, o que fazem? Aproveitam a ocasião para mais alguns exercícios de demagogia, para lançarem mais umas quantas farpas uns sobre os outros para, enfim, se desresponsabilizarem de tão incómoda situação como se esta calamidade cíclica não fosse responsabilidade de todos, responsabilidade passada, presente e futura.
Desordenamento territorial, incivilidade, piromania, interesses obscuros, plantio desregrado de espécies inadequadas, inexistênca de acessos e de pontos de água, falta de meios de combate aos incêndios, incumprimento de legislação. E depois? De que estão à espera senhores governantes, senhores autarcas, poder judicial? Invertam a situação. Ou será que deveremos encarar como uma fatalidade este estado de coisas? Ou será que haveremos forçosamente de concluir que vós sois demasiado ineptos sequer para não deixar que o País arda Verão após Verão, ano após ano?
Mais uma vez o País ardeu e uma imensa nuvem de fumo cobriu-o de norte a sul, sentimo-lo aqui em Beja, sentiram-no os veraneantes a banhos nas praias algarvias. Arde o País, arde a nossa auto-estima, arde a nossa esperança no futuro. Para o próximo ano como será? Meu pobre País, que tão poucos motivos me dás de orgulho e tantos me dás de tristeza e desalento. 
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