quarta-feira, julho 27, 2005
  Uma Candidatura Serôdia

A candidatura de Mário Soares à Presidência da República não deixa de causar alguma perplexidade e alguma apreensão.
Não pelo facto de o candidato ser muito idoso para tal desempenho, como alguma opinião pública e publicada tem sustentado. Esse não foi óbice que haja impedido outros de se candidatarem e concretizarem mandatos com proficiência: lembremos Sandro Pertini, Churcill, Eamon De Valera. Supomos que não seria agora também o caso. Mas Mário Soares há escassos seis meses havia garantido, peremptoriamente, que em caso algum voltaria a ser candidato à Presidência da República. Depois de uma carreira política mais do que brilhante, opositor contumaz à Ditadura, a figura mais proeminente na luta que ele mesmo encabeçou para dotar o País de estruturas democráticas aquando da deriva totalitária do pós-25 de Abril, duas vezes primeiro-ministro, dois mandatos cumpridos como mais alto magistrado da Nação, Pai da Pátria, enfim, nada faria prever o seu regresso às lides políticas. Tal como um atleta de alta competição deve saber o momento exacto da sua retirada também Mário Soares o havia sabido fazer. O seu regresso tem um sabor a requentado, um ar de déjà vu, um aspecto passadista e que não projecta futuro.
Mas Mário Soares apenas está a pagar a factura da falta de estratégia dos dirigentes políticos seus correligionários, subordinada que está a actuação política destes ao mais rasteiro tacticismo, ao mais deplorável carreirismo. Falhos de generosidade, avessos a qualquer luta política menos proveitosa e mais dúbia, empurraram para a frente o velho leão que, porque nobre de nome e de carácter, não enjeitou o desafio. E mais uma vez António Guterres, em quem a direcção actual do Partido Socialista, de forma incauta, tudo havia apostado, não compareceu à chamada, apostado que está agora numa brilhante carreira política internacional e sem paciência, diz-se, para as questiúnculas da política caseira. Isto é, o País não o merece. Pois que tenha muito boa sorte e que a nós não nos falte.
Preocupante é a incapacidade da actual geração de dirigentes políticos gerar entre si individualidades com projecção, carisma e credibilidade suficientes que os habilitem aos voos exigentes de uma magistratura presidencial. Onde estão tais dirigentes? Não estão. Dependente que está a sua agenda política de tacticismos conjunturais, de interesses pessoais e de grupúsculo, sem visão estratégica da coisa pública, pegam e despegam o poder sem remorso nem paixão, com uma leveza fútil despida de qualquer sentido de serviço público e ética republicana. Pois que não podemos mudar de classe política mudemos de atitude, sejamos mais exigentes e rigorosos no pedir a assunção de responsabilidades.
Quanto à novel e não tão surpreendente candidatura de Mário Soares gostaria, ao menos, de estar optimista, mas de facto não estou. 
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