sexta-feira, janeiro 13, 2006
  Votamos para quê, quando votamos?

Um partido político é, qualquer dicionário no-lo dirá, uma associação de cidadãos organizada em torno de um determinado projecto de sociedade, nas suas vertentes política, social, económica e cultural, e que visa a conquista do poder para a implementação desse mesmo projecto. Seria de esperar, como tal, que transcorridas três décadas de regime democrático os partidos, que se têm revezado no poder, tivessem deixado mais profundas marcas na sociedade. Se éramos, e continuamos a ser, uma sociedade marcada por profundas assimetrias sociais, económicas e culturais, a menos igualitária das que compõem a União Europeia, teremos forçosamente que nos questionar sobre os reais propósitos e eficácia das políticas entretanto desenvolvidas pelos poderes que nos têm governado, tanto mais que essas forças políticas, referimo-nos obviamente ao P.S. e ao P.P.D.-P.S.D., se invocam ambas da social-democracia e ambas dizem visar não somente a democracia política mas igualmente uma crescente e maior democracia económica, sem a qual aquela será sempre e necessariamente anquilosada, incompleta.
Mas a que assistimos nós após cada acto eleitoral? A um esforço concertado de mudança do statu quo? Vislumbramos nós sinais de mudança? Não, o que vemos é uma corrida desenfreada, uma desapiedada e torpe competição partidária pelos despojos do poder, a distribuição dos jobs for the boys, frase que, estou certo, Guterres já terá bastas vezes lamentado ter pronunciado, de tal modo ela glosa lapidarmente as práticas políticas do seu e dos outros partidos.
E as histórias que recentemente têm vindo a lume, a somar a outras passadas, sobre a promiscuidade entre o poder político e os grandes interesses financeiros e empresariais, mais intranquilos nos deixam. Confesso que os episódios narrados pelos media resultam, para mim, simples e vulgar cidadão , de difícil compreensão: ele são a banca e o mundo empresarial mais os conselhos de administração e o poder dos accionistas, os interesses nacionais e os interesses estrangeiros, a compra e venda de acções, a clareza e a opacidade das regras do mercado, a perda de influência estatal em sectores económicos ditos estratégicos, o diabo a quatro. De tudo isto o que resulta? Que ministros, enquanto tal, e legitimamente, porque pretensos defensores dos interesses da República, mantêm relações negociais com o mundo do grande dinheiro e depois que cessam funções governativas nos aparecem como homens de mão daqueles com quem negociaram. Se não há aqui ilegalidade há pelo menos imoralidade. À trindade tantas vezes denunciada composta pelo poder municipal, futebol e construção civil acrescenta-se a relação dual esfera governativa / mundo empresarial.
Votamos para quê, quando votamos? Para que uma revoada de clientes ocupe altos cargos na administração e nos conselhos de administração de empresas públicas e, pelos vistos, também de empresas privadas?
O país há anos que deixou de convergir com a média comunitária, atrasámo-nos até, não obstante os auxílios económicos de que beneficiamos. Índices de desenvolvimento humano tendem a persistir a níveis que deveriam despertar um rebate de indignação cívica, civilidade essa de que também denunciamos um lamentável défice. E senhores governantes, os cidadãos, quando votam, não votam exactamente para os fins que, infelizmente, parecem ser aqueles que são os do vosso entendimento. 
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