domingo, março 12, 2006
  A cabulice é má conselheira

O nosso primeiro-ministro dirigiu-se recentemente à Finlândia em procura de inspiração e ensinamentos para o seu entrevado choque tecnológico. Parece ser agora a Finlândia o exemplo a seguir pela tribo lusitana. Há alguns anos, não muitos, era a verde Irlanda o modelo. Países com uma dimensão humana até inferior à nossa e até há poucas décadas sociedades de rústicos campónios e que, no entanto, souberam dar o salto para patamares de desenvolvimento social e económico invejáveis.
Num passado mais longínquo o país erigido como modelo era a Bélgica, afinal um estado dual, resultante mais da vontade política das potências europeias de então do que da vontade expressa dos seus habitantes e que, contudo, se havia tornado numa sociedade próspera, ordeira e educada. Tudo aquilo que nós não éramos, como não se cansavam de apregoar os homens da Geração de 70, mirando com inveja e despeito a Europa além-Pirinéus, então já tão próxima de nós através do comboio e ao mesmo tempo tão longínqua. Copiámo-la, mas mal, em calão, segundo esse génio de ironia mefistofélica que foi Eça.
A Irlanda em 1986, ano da nossa adesão à então denominada Comunidade Económica Europeia, tinha um índice de desenvolvimento semelhante ao nosso. Agora olhamo-la por um canudo.
O que têm então eles que nós não tenhamos?
Bem, em primeiro lugar eles têm belgas, irlandeses e finlandeses e nós temos portugueses. Depois têm governantes belgas, irlandeses e finlandeses e nós temos governantes portugueses. De seguida terão feito opções correctas em devido tempo e nós ainda andamos a discutir quais as opções que haveremos de tomar. E mais, uma grande parte das nossas preclaras elites não se cansa de nos serrazinar aos ouvidos que o país até nem é viável. Com o esforço e a sapiência de alguns desses excelsos espécimes não o seríamos decerto.
Além de tudo isto, que já não é pouco, têm um paradigma de vida que se pauta pelo esforço, trabalho e persistência. E têm padrões elevados de cidadania e educação. Um exemplo? Cá, o chico-espertismo nacional ensina-nos que não pagar impostos é acto meritório e sinal de sagacidade. Por lá , para além de crime, é anátema social que impede aquele que o faça de ter quaisquer veleidades de fazer carreira política.
Em troca, o Estado é eficaz, até generoso, e trata com respeito os seus cidadãos. Uma realidade que não agrada de todo aos nossos neo-liberais, que acusam o incipiente Estado-Providência, que entretanto construímos, de estorvar o desenvolvimento económico.
É este o nosso paradigma, senhor primeiro-ministro? Não é.
Dê-nos a todos sinais de que está disposto a mudar este estado de coisas. Nomeadamente no seio do Partido que o apoia, porque quando se quer mudar o melhor é mesmo começarmos pela nossa casa.
Querer mudar cabulando aquilo que os outros conseguiram realizar, com esforço e determinação, não é mais do que um sinal da nossa ancestral ronha e preguiça. 
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