domingo, maio 01, 2005
  A Colocação de Professores ou Pior a Emenda que o Soneto

Para os males endémicos de que padece o nosso sistema de ensino e que remontam, pelo menos, aos tempos do Marquês de Pombal, propõem agora algumas luminárias uma panaceia, mais uma a somar a tantas outras, que nisto da educação não há bicho-careto que não meta a colher, a qual é a da "estabilidade do corpo docente". E como é que se vai conseguir tal desiderato? Acabando com o sistema centralizado pelo Ministério de colocação dos docentes e entregando tal processo às autarquias locais e às escolas.
Pressupõe-se assim conquistar a almejada estabilidade do corpo docente mas ainda mais: garante-se que as escolas passarão a ter melhores professores pois que serão elas a seleccioná-los, cooptadas em tal missão pela douta opinião da respectiva autarquia local e famílias. Santa ingenuidade. É sabida a transparência, rigor e honestidade com que decorrem os concursos públicos para as mais diversas funções de Estado.
E como os professores que temos são os actualmente existentes e não outros, e como o recrutamento futuro destes há-de ser feito de entre eles, e como, ao que parece, são na sua maioria notoriamente incompetentes, como vai ser? Vamos mandar os incompetentes para casa, ficar apenas com os bons e arranjar mais uns milhares de competentes passíveis de serem recrutados? É que se não for assim alguém ficará com os incompetentes. Ou não será?
Mas experimentem a solução e verão o que vai acontecer: uma irremediável e perniciosa politização das escolas, um reforço da partidocracia em que já vivemos, o surgimento de escolas do PCP, do PS, do PSD e decerto também algumas do PP e do Bloco de Esquerda, dependendo isso da cor política da respectiva autarquia, o surgimento de mais clientelas políticas com o inevitável cortejo de intrigas, bajulices e reforço do caudilhismo, o surgimento de escolas de primeira, segunda e terceira conforme a atractividade ou repulsividade das regiões em que se insiram, sendo este mais um interessante contributo para a promoção da tão propalada coesão e solidariedade nacionais e, enfim, a perda de autonomia de toda uma classe profissional face aos poderes político-partidários.
O actual sistema de colocação de professores, se enferma de imperfeições, garante pelo menos objectividade na ordenação dos docentes face às suas pretensões de colocação: atende ao grau académico e respectiva habilitação, habilitação profissional e tempo de serviço. Sou docente há 31 anos e orgulho-me de ao longo de toda a minha carreira não ter sido beneficiário de favoritismos de qualquer espécie. O mesmo dirá a maioria dos meus colegas. O que se propõe agora é deveras lamentável, como lamentável será a vida profissional de todos nós, a ir avante tão disparatada quanto insensata proposta.
P.S.: Vasco Pulido Valente disse isto e muito mais em crónica publicada no jornal "Público" de 29/04/05. Recomendo a leitura. 
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